terça-feira, 31 de dezembro de 2013

2013 em balanço

Neste ano que passou, aprofundei resoluções de vida muito importantes, a principal das quais foi apostar na minha especialização profissional. Neste processo percebi contudo que agora tenho de o fazer como parte integrante de uma vida boa, no sentido ético do termo, que quero viver todos os dias, e da qual este blogue constitui, simultaneamente, um compromisso, uma busca de sentido e um registo.

Percebi pois que posso e devo unir os princípios por que procuro orientar a minha vida pessoal às questões profissionais que defendo, e se prendem com a promoção da cidadania, da sustentabilidade e da luta por uma vida melhor. Na realidade, posso fazer profissionalmente aquilo de que gosto mesmo e que também é o que faço melhor. O que não quer dizer que tal seja fácil.

Assim, em relação aos meus projetos profissionais, tive e tenho de continuar a redefini-los tendo em conta as minhas limitações pessoais e as do meu país aqui e agora. Na prática, tal significou um reajustamento da minha produtividade e um repensar no que poderá ser concretamente «feito». Unir as duas componentes da minha vida em termos de atitude e de envolvimento foi o que de melhor consegui começar a implementar no meu quotidiano.

Em relação ao ano sem compras, foi-me tão aliciante quanto fácil vivê-lo epor agora, ficou para sempre :) !

Ou seja, nada tenho a alterar em relação ao que necessito e tenho sido exigente no que respeita a alimentação, saúde e higiene física e espiritual. Procuro cozinhar uma comida cada vez mais biológica, equilibrada e saborosa, e levo sempre  almoço e lanche para o trabalho. Tenho apenas de ter em atenção os meus exames médicos de rotina, e de encontrar um lugar para voltar a fazer yoga, porque o meu professor deixou de dar aulas e eu acabei por ficar um pouco perdida...

No que respeita ao consumo pessoal: vestuário, calçado,... do que eventualmente precisar vou, como em tudo o mais, ter em atenção a relação qualidade preço. Seja como for, não preciso de grande coisa este ano, para além de me ser cada vez mais difícil suportar idas às compras. Também me libertei praticamente do cabeleireiro: acho que encontrei um corte que me fica bem e descobri uma coloração muito leve e natural que faço em casa, pelo que há seis meses que não necessito de nenhum.

Para a casa, tenho praticamente tudo organizado e são também muito poucos os pormenores que me faltam concretizar. Assim, segue-se apenas a manutenção da reorganização da casa que terá de incluir um terceiro grande processo de destralhamento, agora mais radical ainda, nomeadamente no que respeita aos livros que são ainda demasiados. 

O que me parece presentemente fundamental é o afinamento e a consolidação de rotinas quotidianas e regularesdas que me fazem bem, e das que me libertem e simplifiquem cada vez mais do que tem de ser feito. Gostaria de dizer que estou confiante e que tudo irá correr bem, mas como a vida me tem ensinado que há situações difíceis que se nos impõem sem qualquer tipo de transigência, fico-me pela fé. E acho que fico bem.


sábado, 28 de dezembro de 2013

2013: Natal sem «o coração nas mãos»!

Neste ano, o Natal cá em casa foi uma noite como todas as outras. Um jantar para três (o meu filho o pai dele e eu), cada um no seu sítio e ao seu ritmo, com o seu... tabuleiro. Comemos bacalhau cozido com batatas e couves (porque, enfim, este menu gastronómico do dia 24 de dezembro é praticamente sagrado) acompanhado por um bom vinho. Para além do tradicional bolo rei, agora destronado pelo bolo rainha (que apenas leva  frutos secos: nozes, amêndoas, pinhões...) e se vende em toda a parte, fiz uma salada de frutas amarela de que gosto muito (amarela porque é feita apenas com frutos amarelos). Não enfeitei a casa e o Presépio está «montado» todo o ano. 

Ainda tive de lidar com a história das prendas porque não encontrei forma de me escusar (do ponto de vista do coração) ao lanche familiar do dia de Natal, em casa de uma das minhas irmãs. Assim, este ano foi a vez dos sabonetes Ach Brito, dos melhores do mundo e portugueses, claro! Uma das vantagens da opção sabonetes foi a de se ter traduzido num menor número de compras, já que, para os casais, a oferta de um único sabonete tinha uma intenção amorosa incluída. Para os meus sobrinhos, o de sempre: uma pequena nota de euro enrolada numa fita rosa e verde, e livros ilustrados para as pequeninas. Decidi que os embrulhos seriam feitos apenas com as fitas recicladas que tinha em casa. Afinal, já o fazia com as notas, os sabonetes vêm embrulhados em papel colorido e as capas dos livros para crianças são sempre lindíssimas. Porquê gastar então mais papel? 

Assim, o jantar de Natal foi para mim praticamente indiferente. Não foi bom, nem mau, não teve nem risos, nem choros, muito embora o meu filho não estivesse bem, o que somente a medicina e ele podem resolver. Eu apenas posso ajudar, o que é muitíssimo e pouco ao mesmo tempo.

O lanche acabou, como sempre, por ter momentos felizes. Primeiro porque só muito raramente nos reunimos em família: grandes e pequenos, ex-maridos e ex-mulheres, filhos de diferentes casamentos... Mas também porque cada um de nós só vai se quer mesmo ir e só fica o tempo que quiser, às vezes menos de meia hora! Todos se servem dos salgados e dos doces que estão postos na mesa da sala e das bebidas que lhes apetecer. Nem precisamos de nos sentar.

Claro que agora o Natal já não é o que era, mas sobretudo o Natal pode e deve ser sempre que um homem quiser, duas frases feitas que na minha vida de agora adquiriram todo o sentido. Não foi nem stressante, nem doloroso, nem emocionalmente desgastante, nem feliz. Consegui proteger o meu coração ao mesmo tempo que consegui oferecer bem-estar aos que dependem de mim. Quando o meu filho melhorar, reúno todos os que amo e faço um Natal verdadeiramente feliz!



quarta-feira, 25 de dezembro de 2013

Casa minimalista e «decoração na fé»

Como já afirmei aqui antes, no que respeita à construção de uma casa minimalista não posso deixar de me comover com os Dez Mandamentos de Decoração com Emoção da Thalita do blogue Casa de colorir. Pode até ser uma contradição da minha parte, mas já há muito que aprendi a amar as minhas contradições... boas! Destes mandamentos, um dos que já há muito pratico é o da decoração na fé. Na fé no melhor de nós, evidentemente!

Assim, depois das obras cá em casa e do respetivo destralhamento geral (o segundo nesta casa!), voltei a harmonizar os meus santos.


Avé, Maria, cheia de graça...
(Nossa Senhora da Conceição, a que tem as duas mãos postas)

Namo tassa bhagavato arahato samma sambuddhassa.
(Honour to the blessed'one, the exalted one, the fully enlightened one)
(Budha) 

Salve, rainha, mãe misericordiosa, vida, doçura e esperança nossa, salve! 
(Nossa Senhora com o menino nos braços)

Om namah shiva...
(Shiva)

Bate o sino/ pequenino/sino de Belém
Já nasceu/o Deus menino/para o nosso bem!

(O Presépio)
Todas estas imagens me são queridas e me fazem sentir bem e em casa. Acredito que Nossa Senhora seja a apropriação cristã de Gaia, Géia, Gea ou , a deusa Terra, a Mãe Terra. Ou antes ainda, nos primórdios da nossa humanidade: aquele(a) que tudo dá: BHAG (o mais antigo nome indoeuropeu para deus), o ser primordial gerador de vida. Tal como me interrogo se Nataraja shiva (o rei dos dançarinos) não seria originalmente uma mulher... Já o gesto simbólico de mãos postas de todos os cristãos não tenho dúvidas que tenha a mesma origem do muito mais antigo prônam mudra (do sânscrito). Seja como for, para mim, Buda como Cristo são exemplos de seres de exceção, cuja vida e ensinamentos nos iluminam e nos tornam pessoas melhores.


Por isso, não sendo crente, honro os meus santos enquanto memória da espiritualidade humana milenar e símbolos de determinação e de, a que move montanhas, e nos ajuda a lutar pelo mais difícil, pelo impossível até.

Em nome do Espírito Santo, aquele que inspirará o reinado mais elevado do desenvolvimento humano.

 Amén...

sábado, 21 de dezembro de 2013

Solstício de inverno: as fogueiras de Natal

O inverno de 2013 (o tempo mais frio e mais sombrio do ano do hemisfério norte) terá início hoje, 21 de Dezembro às 17h11, dia do solstício de inverno.

Imagem retirada daqui.


A palavra solstício deriva da palavra latina solstitium (sol + sistere, que significa estacionário): o sol parado nessa posição na órbita celeste. Este dia assinala a noite mais longa do ano neste lado do planeta e significa também, o que muitas vezes esquecemos, que todas as seguintes serão sempre um pouco mais curtas. Até 21 de março de 2014, às 16h07, data do equinócio da Primavera, em que de novo o dia e a noite têm a mesma duração, do latim equi, como em equilíbrio.

A história da humanidade regista a celebração desta data em distantes e diversas culturas desde tempos imemoriais: na noite mais longa, como saber se a noite não aumentaria mais e mais e mais, instalando-se para sempre? 

Por isso, no meio desta noite que nos países católicos, como Portugal, se transferiu para a véspera de Natal, os seres humanos se reuniam e se reúnem ainda para convocar o sol através do fogo, do canto e dança. Para vencer o terror de uma perpétua escuridão noturna e deste modo propiciar um pouco mais de sol em cada dia.

Em Portugal, esta tradição ancestral e pagã convive bem com o nascimento do Menino Jesus e a Missa do Galo. Assim, de norte a sul do país, todos os anos se acendem milhares de grandes fogueiras de Natal, também conhecido como o Madeiro de Natal, quase todas alimentadas até ao Dia de Reis, contribuindo em muito para a alegria e para a coesão da comunidade.
 
Preparação, aqui em Barrancos, feita uns dias antes.
Fogueira de Natal em Monforte.
Para quem quiser saber um pouco mais desta tradição que, depois de quase extinta em diversos locais, tem vindo a ser vigorosamente recuperada pelos próprios habitantes de cada localidade, este breve vídeo de um 1:18 mostra o calor partilhado da fogueira de Natal numa pequena vila do norte de Portugal, Sendim.

domingo, 15 de dezembro de 2013

Surpreendentemente, como só nós, humanos: o jardim na cidade

Antes de ser um ser sinónimo de uma zona da cidade ou o nome de uma estação de Metro, o Campo Grande, em Lisboa, era o Jardim do Campo Grande, um lugar de passeio e de lazer dos lisboetas durante cerca de dois séculos, desde o seu desenho como «Passeio Público», no reinado de D. Maria I. Contudo, nos últimos trinta anos, a utilização do Jardim tornou-se muito condicionada, não apenas pelas vias rápidas do tráfego rodoviário de acesso Norte a Lisboa, que o rodeiam como um muro, mas também pela ausência de investimento camarário na respectiva manutenção: uma tirinha de verde, envelhecido e abandonado, em plena da selva de asfalto e de trânsito.

Via http://pelosjardinsdelisboa.blogspot.com/2008/08/parquejardim-do-campo-grande-cg_10.html
Antes, muitas e diferentes gerações de lisboetas fruíram deste espaço de formas diversas: no século XIX, assistindo a corridas de cavalos e indo às várias feiras que ali tinham lugar, depois passeando, merendando e convivendo. E, já na segunda metade do século XX, aprendendo a nadar nas Piscinas do Campo Grande, alugando barcos a remos num dos seus lagos artificiais, lanchando nas duas explanadas ali existentes. Essa foi uma parte da minha infância e as tardes que as minhas irmãs e eu lá passámos verdadeiros momentos de alegria pura.

Já era a tal tirinha de 1200 metros de comprimento por 200 metros de largura, mas, superado o perigo de atravessar a «via rápida», era um jardim extraordinário, com árvores gigantescas, bancos de madeira, relvados frescos e arruamentos sinuosos, onde as crianças corriam e brincavam, os jovens andavam de bicicleta, os mais velhos liam o jornal, os namorados caminhavam de mãos dadas...


Via http://mulher.sapo.pt/actualidade/em-foco/
Reaberto ao público há pouco tempo, depois de cerca de dois anos de obras, o jardim parece ter renascido. Dou comigo mesma a pensar que, mesmo com o tráfego que o cerca como uma barreira asustadora, tão perigosa que várias pessoas aí morreram atropleladas, esta «amostra urbana» de «natureza domesticada» continua a atrair-nos e a oferecer-nos bem-estar e aleria de viver. Emanando uma vitalidade que nos abençoa e que muitas vezes menosprezamos, de tal modo nos formatámos já à vida da cidade grande.

Espaço de convívio transgeracional e por isso mesmo precioso, o Jardim do Campo Grande foi celebrado no Fado do Campo Grande (letra de Ary dos Santos, música de Vitorino de Almeida), Neste fado que é uma declaração de amor a Lisboa, reconheço-me sempre com alguma emoção nos versos iniciais:  «A minha velha casa,/ por mais que eu sofra e ande,/ é sempre um golpe de asa,/ varrendo um Campo Grande...».

domingo, 8 de dezembro de 2013

Nelson Mandela: so long Madiba...

A primeira vez que ouvi falar em Nelson Mandela tinha 23 anos. Estava em Moçambique, então um jovem país recém-independente, a dar aulas de português na Escola Comercial de Maputo. Nesses quase dois anos de trabalho aprendi a verdadeira História de África: da pré-história da humanidade, aos primeiros contactos com árabes e europeus, dos grandes reinos africanos à escravatura, da Conferência de Berlim à partilha de África, ao colonialismo e ao apartheid.. 

A partir de então, Nelson Mandela tornou-se numa das minhas referências de vida. Lembro-me muito bem do dia em que foi libertado e da comoção internacional que as imagens televisivas desse evento provocaram um pouco por todo o mundo e no meu coração.

Por isso, hoje, de tudo o que de extraordinário Mandela realizou - da luta contra o apartheid à luta pela reconciliação do seu povo - queria deixar aqui duas das mais comoventes imagens deste homem tão austero e exigente, antes do mais consigo próprio.



O seu amor sem limites e a sua fé nas crianças e nos mais novos, documentados pela Fundação Nelson Mandela onde o podemos ouvir cantar a sua versão de Twinkle, twinkle litle star.

Com Mandisa Dlanga, cantora da banda de J.C., Savuka, em 1999.
E a cantar e a dançar, em 1999, num concerto público, a famosa canção Asimbonanga, «uma música e uma dança que me puseram em paz com o mundo e em paz comigo próprio», como então afirma (ao minuto 4 do vídeo acima).

Composta, em 1986 pelo músico sul-africano Johnny Clegg, detentor de um percurso de vida que espelha as contradições da África do Sul, e numa época em que cantá-la significou ser preso por diversas vezes, Asimbonanga tornou-se num símbolo da luta de Nelson Mandela por uma África do Sul livre do racismo.
Asimbonanga, Johnny Clegg (1986)
(Letra em Zulu e em inglês)

Chorus:
Asimbonanga--------------------(we have not seen him)
Asimbonang' umandela thina-----(we have not seen mandela)
Laph'ekhona--------------------(in the place where he is)
Laph'ehleli khona--------------(in the place where he is kept)

Oh the sea is cold and the sky is grey
Look across the island into the bay
We are all islands till comes the day
We cross the burning water

Chorus:
Asimbonanga--------------------(we have not seen him)
Asimbonang' umandela thina-----(we have not seen mandela)
Laph'ekhona--------------------(in the place where he is)
Laph'ehleli khona--------------(in the place where he is kept)

A seagull wings across the sea
Broken silence is what I dream
Who has the words to close the distance
Between you and me

Chorus:
Asimbonanga--------------------(we have not seen him)
Asimbonang' umandela thina-----(we have not seen mandela)
Laph'ekhona--------------------(in the place where he is)
Laph'ehleli khona--------------(in the place where he is kept)

Asimbonang 'umfowethu thina----(we have not seen our brother)
Laph'ekhona--------------------(in the place where he is)
Laph'wafela khona--------------(in the place where he died)
Hey wena-----------------------(hey you!)
Hey wena nawe------------------(hey you and you as well)
Siyofika nini la' siyakhona----(when will we arrive at our des
tination) ]


Dizem que não há ninguém insubstituível, o que não é evidentemente verdade. De entre nós, há uns que são o melhor de nós. E apenas alguns, excecionais. São os que nos iluminam e nos asseguram que o nosso mundo pode ser um mundo melhor. Por isso, é nosso dever lembrá-los e passar o seu testemunho aos mais novos. O que, aliás, Nelson Mandela de tantas e de tão diversas formas defendeu. Como numa das suas citações de que mais gosto:

«Let us remind ourselves that is ordinary people 
- men and women, boys and girls -
 that make the world a special place».

JONATHAN EVANS / Reuters
JONATHAN EVANS / Reuters
JONATHAN EVANS / Reuters
So long, Madiba...



Créditos das duas últimas fotos:
Mandela: Jonathan Evans - Reuters.
Velas: aqui.