quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Treinar o sentido de humor e a felicidade

Na semana passada conheci o blogue de uma minimalista completamente diferente do padrão «dominante» deste tipo de blogues: a Dora Mota, jornalista de 37 anos, mãe de uma menina de 5 anos, autora de Lugares habituaisE tenho de dizer aqui que me fez muito bem. Por duas razões.

Em primeiro lugar porque a Dora é uma mulher do Norte, do Norte que eu conheço, evidentemente: Minho, Trás-os Montes e Beira Alta, e tenho de o dizer, eu, que sou lisboeta de uma família de pelo menos cinco gerações, dessas lisboetas que, como afirmava um colega do Curso avançado de revisão de texto que fiz na Universidade Católica de Lisboa, «vão à terra quando saem de casa», repito, tenho de o dizer com todas as letras: não há gente como o povo do Norte!

Obrigada, Dora!
Digo isto porque as «minhas» pessoas do Norte são ativas e despachadas, brincalhonas e matreiras, fortes, resistentes e agrestes como o granito e como o granito (con)fiáveis!

A minha infância foi povoada de histórias, «casos», cantares e danças da nossa Delfina, a minhota mais expedita, ladina e voluntariosa que imaginar se possa. E, muito mais tarde, não houve nenhumas férias que eu tivesse passado na Beira Alta (e foram anos seguidos) em que não me tivesse encantado com a atitude perante a vida dos homens e mulheres da raia das terras do fim do mundo.

Nos dias quentes de Verão, chegavam à casa grande familiar, a meio da manhã, os tios, tias, primos e primas, com muitos cestos e crianças e, não sei explicar como, antes do meio dia já estávamos todos à beira do rio, com as toalhas aos quadrados estendidas na erva. Dos cestos saiam panelas de arroz perfumado e travessas de bolos de bacalhau, as saladas apareciam misteriosamente frescas e temperadas, os enchidos, as febras e as trutas eram grelhadas ali mesmo, e comíamos tudo em cima de fatias de pão de centeio. No inverno, só mudava a ementa e o cenário: na casa grande, a mesa aparecia aumentada com várias mesas (como agora o Ikea diz ser moda), as batatas fritavam-se quase por si próprias em duas ou três sertãs, o cabrito era assado nas brasas e o esparregado era o melhor do mundo!

Entretanto, nunca parávamos de conversar, todos ao mesmo tempo, e todos uns com os outros, bebíamos um vinho leve, um pouco adstringente, os homens falavam de caçadas, as mulheres de receitas, todos se pronunciavam sobre políticas e partilhas, as crianças riam e asneavam o tempo inteiro... À sobremesa comíamos pudim e fruta, e em três tempos a loiça aparecia lavada e a cozinha varrida e arrumada, seguíamos em procissão até ao café, sempre em grandes conversetas e risos, ralhando e brincando com a canalha pequena, e depois já era o fim do dia e «ala que se faz tarde, que daqui até casa ainda são um ror de quilómetros e fazei o favor de irdes devagarinho que a estrada não é de fiar»! Com a mesma revoada com que chegavam, desapareciam, a casa ficava em silêncio e eu achava que tudo tinha sido um sonho bom!

Em segundo lugar, porque a Dora me fez rir como eu já nem sabia como era eu a rir. E me fez pensar que a minha vida anda muito triste (eu conheço de cor (de ) todas as sérias razões que me assistem, mas não tenho por que me render a elas), e que o meu blogue é demasiado sério e melancólico, num jeito tão, mas tão português de ser, que já não se aguenta. Perdi pois definitivamente a paciência, a tal, que é característica dos meus antípodas, e...daqui para frente tudo vai ser diferente (atenção, Brasil, conto muuuuuuito convosco nessa hora!)

Decidi e aqui o declaro com a maior seriedade que tenho de realizar mais uma importante mudança em 2014 e esta com prioridade absoluta: concentrar-me apenas no lado bom da vida e treinar o meu quase extinto sentido de humor. Sei que o posso fazer e sei como se faz, só preciso é mesmo de o fazer.

Por último, mas não em último, o blogue da Dora confirmou-me o quanto esta nossa comunidade, a dos que querem viver uma vida mais simples, regida por valores essenciais e decididamente feliz, se caracteriza por uma maravilhosa diversidade.


quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

May you all bless me, dear mothers and sisters before and behind me...

Há dois meses escrevi aqui que, neste meu percurso por uma vida mais simples, desejava uma vida frugal e exigia, para mim própria, uma vida melhor. Mas, na realidade, de que estou eu concretamente a falar?

Sei que estou a preparar uma mudança radical de vida para os próximos anos (dois anos, cinco, oito, não sei...), e que para tal tenho de caminhar devagar, mas com firmeza e muita paciência. O que, só por si, implica no meu caso uma grande aprendizagem: não apenas porque tenho alguma tendência para acelerar, mas também porque todos nós sabemos que a paciência é uma virtude... chinesa, ou seja, praticada nos antípodas, pelo menos... de mim!

Neste ano de 2014, tenho em primeiro lugar de me dedicar ao meu filho e também ao pai dele. Tanto um como outro estão doentes, cada um deles em grave depressão, e precisam de construir vidas boas e independentes de mim: um assumindo progressivamente uma vida adulta e o outro construindo um tempo de reforma recompensador e feliz. E a primeira fase da mudança ocorrerá já neste mês de janeiro.

O que significa que terei de investir emocionalmente na melhor forma de conduzir este processo difícil e doloroso para os três e só poderei fazê-lo cuidando mais de mim. Ou seja, tenho de dormir bem, de comer bem, de praticar mais horas de meditação, isto no mínimo, de modo a conseguir aquietar o meu coração e tranquilizar-me interiormente.

A fé e a força de que necessito para levar a cabo esta primeira fase e todas as outras que se lhe seguirão repousam em mim própria, enquanto mulher, conscientemente herdeira de gerações e gerações de mulheres, as «cuidadoras» da espécie humana

A noção de «cuidados»* é uma noção que só agora começa a ser estudada e avaliada até mesmo em termos económicos e sociais. Como presentemente é definida, abrange as intervenções que têm por objetivo manter, atender, reequilibrar ou cuidar da família e da comunidade. Na prática, são os trabalhos invisíveis e as tarefas obscuras repetidas todos os dias da vida, na sua maioria despensados por todas as mulheres em toda a parte do mundo que têm desde sempre garantido a sobrevivência das sociedades humanas e da própria vida: os trabalhos de criação (crianças, animais, vegetais...), de manutenção da capacidade produtiva de um terreno, de regeneração de um território devastado, de construção e conservação de abrigos (casas, vestuário...) de transmissão de saberes sobre a saúde ou sobre alimentos….

Estes trabalhos de cuidados constituem esteios de vida e são chaves para a sustentabilidade.… Realizados sem horários, em permanente e incessante luta contra a corrente de todo o tipo de carências: desordem, sujidade, falta de alimentos, abandono afetivo e efetivo... desde tempos imemoriais.

Australopithecus afarensis 3.85 - 2.95 milhões de anos a. C.
Neandertais, 50 000 - 30 000 a.C.
Mulher sapiens sapiens 160 000- 200 000 anos a.C.
Espanha, séc. XVI (Velásquez).
Mulher esquimó (1933).
OndjoyetuSumbe, Angola.
Fujian, China.
Yaopu, Shaxni, China.
Cidade de Guatemala.
Peshawar, Paquistão.
Muriaé, Brasil.
Portugal.
É pois à memória coletiva da força interior necessária à realização dos trabalhos de cuidados realizados ancestralmente por mulheres de todas as latitudes, minhas mães e minhas irmãs, que irei pedir a benção e a ajuda de que agora necessito.



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Yaro Herrero, Fernando Cembranos e Marta Pascual (coord.) – Cambiar las gafas para mirar el mundo: una nueva cultura de la sostenibilidad. Madrid: Libro sen Acción, 2011, p. 181.201

quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

Bom Ano Novo, querido planeta Terra!

Querido Planeta Terra:

Herdámos-te sem sabermos o quanto eras precioso. Usamos-te quase à exaustão e abusamos sistematicamente de ti tanto quanto de nós próprios, os sapiens sapiens. Demorámos demasiado tempo a perceber que eras a nossa casa e que enquanto tal eras o melhor que nos poderia ter acontecido...

Ao não nos comprometermos em deixar o mundo melhor do que o encontrámos, continuamos a inflingirmo-nos muito mal, todos os dias, e estamos ainda muito longe de ser a maioria, os que lutam por te entregar menos ferido e doente a uma geração mais responsável do que nossa.


A nossa casa Terra vista do espaço:
 
De dia
Via lepanto.com.br

e de noite,
Via eternosaprendizes.com

com a sua pequena Lua
Via ciencia-em-si.webnode

e os seus milhares de satélites artificiais 
(na sua maioria... lixo espacial)
a vintum.wordpress.com

... lindíssima, preciosa e única!


Se puder, não deixe de ver Home, o mundo é a nossa casa, um documentário produzido pelo jornalista, fotógrafo e ambientalista francês Yann Arthus-Bertrand. Inteiramente realizado com imagens aéreas de vários lugares da Terra, mostra a diversidade da vida no nosso planeta e como a humanidade colocou em perigo o equilíbrio ecológico. O filme estreou a 5 de Junho de 2009 nos cinemas, em DVD e no YouTube, simultaneamente em 50 países diferentes. É gratuito, sem objetivos nem lucros comerciais, e está também legendado em diferentes línguas, entre as quais o português.

E, por favor, divulgue-o.