quinta-feira, 25 de abril de 2013

Dia 206: 25 de abril, sempre!

25 de abril
Tive a imensa sorte de pertencer a uma geração que tinha 20 anos no dia 25 de abril de 1974. Porque pudemos viver intensamente a alegria de acreditarmos na possibilidade de concretizar o sonho, ou melhor, todos os sonhos... bons! 

Pudemos viver histórias extraordinárias: mostrar o mar a crianças que nunca o tinham visto (nem comido sanduíches de fiambre, nem mousse de chocolate...), dar aulas de alfabetização a adultos, trabalhar com os então sessenta jardineiros do jardim do Campo Grande, em Lisboa, fazer a apanha do tomate com os ranchos de mulheres ribatejanas que trabalhavam à jorna, elaborar um trabalho crítico sobre a primeira proposta de lei de imprensa na faculdade, viajar pela Europa à boleia, acampar nas praias mais selvagens do nosso país... Tudo nos foi permitido sonhar e viver!

Claro que foi muito difícil, depois, perceber que a vida não é como a sonháramos. Chico Buarque foi um dos primeiros a dizer-nos que a vida não é um sonho bom (e muito menos justa...) quando, em 1978, alterou a primeira versão de Tanto Mar de 1974!

As duas versões de Tanto mar...
TANTO MAR (1ª. versão, 1974)
Sei que estás em festa, pá
Fico contente
E enquanto estou ausente
Guarda um cravo para mim
Eu queria estar na festa, pá
Com a tua gente
E colher pessoalmente alguma flor
No teu jardim
Sei que há léguas a nos separar
Tanto mar, tanto mar
Sei também quanto é preciso, pá
Navegar, navegar
Lá faz primavera pá
Cá estou doente
Manda urgentemente algum cheirinho
De alecrim
 

TANTO MAR ((2ª. versão, 1978)
Foi bonita a festa, pá
Fiquei contente
Ainda guardo renitente um velho cravo para mim
Já murcharam tua festa, pá
Mas certamente
Esqueceram uma semente nalgum canto de jardim
Sei que há léguas a nos separar
Tanto mar, tanto mar
Sei, também, quanto é preciso, pá
Navegar, navegar
Canta primavera, pá
Cá estou carente
Manda novamente algum cheirinho de alecrim

Muitos anos passaram já depois do tempo dos sonhos que vivemos mesmo nos anos setenta. Agora, a crise que nos mata um pouco mais em cada dia que passa é o fim da... festa, pá! A confirmação da impossibilidade de tornar os sonhos realidade.

Contudo, por muito que nos ameacem com uma dívida colectiva de tantos algarismos que não é possível sequer conceber, com a bancarrota, com a miséria e o caos, quem pôde como eu viver o 25 de abril aos vinte anos, sabe que isso não é bem verdade: em todas as primaveras renascem cravos em condições que parecem impossíveis! E depois, dos sonhos que sonhámos, alguns sobrevivem, outros transmutaram-se, muitos estão subjacentes a muitas realidades que hoje todos vivemos realmente. Como a convicção profunda de que é preciso sonhar o que queremos que aconteça!


25 de abril, Cantos de Portugal in Deviantart.

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