Em primeiro lugar porque a Dora é uma mulher do Norte, do Norte que eu conheço, evidentemente: Minho, Trás-os Montes e Beira Alta, e tenho de o dizer, eu, que sou lisboeta de uma família de pelo menos cinco gerações, dessas lisboetas que, como afirmava um colega do Curso avançado de revisão de texto que fiz na Universidade Católica de Lisboa, «vão à terra quando saem de casa», repito, tenho de o dizer com todas as letras: não há gente como o povo do Norte!
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Obrigada, Dora! |
Digo isto porque as «minhas» pessoas do Norte são ativas e despachadas, brincalhonas e matreiras, fortes, resistentes e agrestes como o granito e como o granito (con)fiáveis!
A minha infância foi povoada de histórias, «casos», cantares e danças da nossa Delfina, a minhota mais expedita, ladina e voluntariosa que imaginar se possa. E, muito mais tarde, não houve nenhumas férias que eu tivesse passado na Beira Alta (e foram anos seguidos) em que não me tivesse encantado com a atitude perante a vida dos homens e mulheres da raia das terras do fim do mundo.
Nos dias quentes de Verão, chegavam à casa grande familiar, a meio da manhã, os tios, tias, primos e primas, com muitos cestos e crianças e, não sei explicar como, antes do meio dia já estávamos todos à beira do rio, com as toalhas aos quadrados estendidas na erva. Dos cestos saiam panelas de arroz perfumado e travessas de bolos de bacalhau, as saladas apareciam misteriosamente frescas e temperadas, os enchidos, as febras e as trutas eram grelhadas ali mesmo, e comíamos tudo em cima de fatias de pão de centeio. No inverno, só mudava a ementa e o cenário: na casa grande, a mesa aparecia aumentada com várias mesas (como agora o Ikea diz ser moda), as batatas fritavam-se quase por si próprias em duas ou três sertãs, o cabrito era assado nas brasas e o esparregado era o melhor do mundo!
Entretanto, nunca parávamos de conversar, todos ao mesmo tempo, e todos uns com os outros, bebíamos um vinho leve, um pouco adstringente, os homens falavam de caçadas, as mulheres de receitas, todos se pronunciavam sobre políticas e partilhas, as crianças riam e asneavam o tempo inteiro... À sobremesa comíamos pudim e fruta, e em três tempos a loiça aparecia lavada e a cozinha varrida e arrumada, seguíamos em procissão até ao café, sempre em grandes conversetas e risos, ralhando e brincando com a canalha pequena, e depois já era o fim do dia e «ala que se faz tarde, que daqui até casa ainda são um ror de quilómetros e fazei o favor de irdes devagarinho que a estrada não é de fiar»! Com a mesma revoada com que chegavam, desapareciam, a casa ficava em silêncio e eu achava que tudo tinha sido um sonho bom!
Em segundo lugar, porque a Dora me fez rir como eu já nem sabia como era eu a rir. E me fez pensar que a minha vida anda muito triste (eu conheço de cor (de ♥) todas as sérias razões que me assistem, mas não tenho por que me render a elas), e que o meu blogue é demasiado sério e melancólico, num jeito tão, mas tão português de ser, que já não se aguenta. Perdi pois definitivamente a paciência, a tal, que é característica dos meus antípodas, e...daqui para frente tudo vai ser diferente (atenção, Brasil, conto muuuuuuito convosco nessa hora!)
Decidi e aqui o declaro com a maior seriedade que tenho de realizar mais uma importante mudança em 2014 e esta com prioridade absoluta: concentrar-me apenas no lado bom da vida e treinar o meu quase extinto sentido de humor. Sei que o posso fazer e sei como se faz, só preciso é mesmo de o fazer.
Por último, mas não em último, o blogue da Dora confirmou-me o quanto esta nossa comunidade, a dos que querem viver uma vida mais simples, regida por valores essenciais e decididamente feliz, se caracteriza por uma maravilhosa diversidade.