domingo, 30 de dezembro de 2012

Dia 91: 2012 em balanço

Na verdade o ano civil, pelo menos aqui no hemisfério norte, só em parte marca o nosso ritmo de vida. Desde jovem que o considero mais como a comemoração coletiva do aniversário do nosso planeta, embora saiba que se trata mais de um projeto de apenas alguns de nós, humanos. Mais prosaicamente, constitui também o marco do balanço financeiro anual das nossas vidas que o Ministério das Finanças nos solicita... obrigatoriamente. Tudo junto, a passagem de ano civil não é pois uma data de somenos importância nas nossas vidas. 

Contudo, muitas das nossas decisões de vida têm lugar no final das férias grandes do nosso verão, por volta de setembro, um tempo talvez mais apropriado para o fazer: o tempo do calor e do descanso está a terminar, sentimo-nos repousados e temos todo um novo ano de trabalho pela frente. Seja como for, em setembro ou em dezembro, ou ainda em março quando entregamos a declaração do IRS, estas datas levam-nos a realizar balanços anuais e intercalares que considero muito úteis.

Imagem retirada daqui.
Neste ano que passou, tomei resoluções importantes, a principal das quais foi a de apostar na minha especialização profissional direcionada para o desenvolvimento das bibliotecas públicas, mas fazê-lo como parte integrante de uma vida boa, no sentido ético do termo, que quero viver todos os dias, e que este blogue tenta definir. O mais difícil tem sido viver estas decisões com os constrangimentos da minha vida pessoal que em muito ultrapassam a minha vontade e até mesmo a minha força física e anímica. 

Em relação ao primeiro trimestre do meu 1º ano sem compras, devo concluir que me tem sido fácil vivê-lo, e até mesmo esta fase complicada em que vivo tem contribuído positivamente nesse sentido: acabei por simplificar mais ainda o Natal.

No que respeita às prendas, decidi-me por apenas uma por adulto: meias para os homens da família e collans para as manas. Como sempre faço, dei a cada um dos meus sobrinhos dei uma nota de euros, a mais pequena, devidamente enrolada na sua fita vermelha, e às pequenitas livros infantis ilustrados que todos os anos me oferecm. Apenas abri uma exceção para o meu filho que queria um anel. Custou-me cerca de 50 € e expliquei-lhe que tinha também um valor simbólico, o de mudança que ele está tentando levar a cabo com tantas dificuldades. A minha cadelinha foi presenteada com uns arreios para susbstituir a coleira que tinha e que penso que a magoava.

O jantar de Natal foi, este ano, foi feito a meias com uma das minhas irmãs e foi também simplificado: tirando o tradicional bacalhau de que os adultos não abdicam, acabou por ser vegetariano: pasta com molho de tomate, cogumelos cozinhados em alho, azeite e coentros, batatas novas assadas em azeite e alho e esparregado de nabiças e diversos queijos. Os doces ficaram-se pelo Bolo Rei que é comprado e pela mousse de chocolate...

Não digo que não tenha tido algumas tentações consumistas, mas basta-me pensar no destralhamento e na reorganização que tenho vindo a fazer na minha casa para me ser de imediato evidente aquilo que precisaria-gostaria (porque precisar-precisar não preciso mesmo de nada) de ter.

Projetos, uns novos outros para continuar, tanto pessoais com profissionais tenho vários. E é para os realizar que tenho de me fortalecer e de me preparar.
Imagem retirada daqui.

sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Dia 89: Início do inverno

Embora o inverno de 2012 tenha chegado, como sempre, antes do Natal, e pontualmente no dia do seu solstício, às 11h11 do dia 21 de dezembro, a verdade é que desta vez não me dei conta. Talvez porque para mim o inverno já tivesse mesmo chegado antes.

Solstício de Inverno (imagem retirada daqui).


Neste tempo em que fui obrigada a hibernar parcialmente, como os animais e as árvores, o meu filho começou apenas a recuperar da crise, o jantar de Natal foi tranquilo e reconfortante e o sol voltou. Preciso de me recordar sempre que o início do Inverno assinala também o facto de que, em cada dia que passa, nos é oferecido mais tempo de luz.

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Dia 80: Chove chuva... chove sem parar...

Pois é, há alturas em que a vida nos exige muito mais do que estamos preparados para dar e para aguentar! Eu bem tentei durante uns dias em Novembro, quatro para ser mais precisa, distanciar-me do stress e da angústia que estão a tomar conta da minha vida. Mas não foi suficiente. Agora fui proibida pelo médico de fazer outra coisa que não seja descansar e sobretudo tentar não sentir (mas como não sentir?) durante 15 dias! Sei, pela minha experiência da prática de yôga que isso é possível, mas não fácil.

Boletim metereológico: Lisboa, dezembro de 2012.

De repente o meu eu interior desabou: primeiro foi o meu filho que está a atravessar uma crise muito difícil, com a qual não sei lidar. Depois foi como se a chuva fria e fina que há tantos dias não pára de cair tivesse revelado e cruzados toda a tristeza da crise em que viv(o)emos.

Como é possível que no meu país, sejam aos milhares as crianças que vão de manhã com fome para a escola? Se vivemos na Europa rica e desenvolvida, se somos tão poucos e temos cada vez menos crianças? Como é possível que tantos avós façam tantos sacrifícios para ajudar os netos e os filhos, desempregados aos milhares? Que os muito mais velhos sejam maltratados nos lares onde as famílias os deixam morrer devagar?

Sei que tudo isto me dói muitíssimo porque me sinto impotente para tentar mudar esta situação, tanto quanto a do meu próprio filho! Não vejo o caminho de saída, a luz ao fundo do túnel! Para uma mãe, a dor de um filho é insuperável, hemorrágica e manietadora. A tentação de desistir, de largar tudo e de optar por um nada, um vazio total sem princípio nem fim, é quase irresistível! Os meus amigos dizem que sempre fui uma lutadora, mas lutar como modo de vida é para samurais, não para mim, no meio-fim da vida ainda aprendiz de simplesmente pessoa.

Não quero viver como samurai!
Não tenho vivido dias de amar a vida! É um quase-pecado, eu sei. E, por isso também, adoeci: viver em desamor com a vida é para mim contra natura.

Preciso de dias de sol, tanto como de respirar ar livre e de um abraço dos meus amigos.

domingo, 2 de dezembro de 2012

Dia 63: Não comprar mais NADA... NOVO!

Se prestarmos atenção, são já significativas as vozes que, em plena sociedade de consumo, defendem a reutilização maximizada de tudo o que nos é necessário. E, na verdade, por que razão devemos comprar objetos novos, quando estes mesmos objetos abundam à nossa volta em excelente estado e a preços muito inferiores?

As tradicionais feiras de garagem americanas, como as pequenas feiras de velharias em Portugal, constituem há muito a prova de que «o lixo de uns é o tesouro dos outros», trazendo contentamento e inúmeras vantagens a vendedores e a compradores. 

Feira de Velharias em Coimbra, 2008.
Dada a crise em que vivemos, as chamadas lojas «sociais» onde pessoas carenciadas se vão abastecer de artigos doados pela comunidade, devidamente apresentados, organizados por tipo, tamanho e cor, têm, por seu turno, conhecido um incremento significativo. Do mesmo modo, as lojas de roupa em segunda mão, começam a ganhar no nosso país um valor positivo, valorizado agora pela designação vintage.

Loja social em Viana do Castelo, 2010.
Um dos mais conhecidos grupos que se reuniram com o propósito de não comprar nada ou nada novo foi criado, em 2004, por 50 pessoas em São Francisco, EUA. Através de um Yahoo group, denominado The Compact, partilham conselhos, oferecem-se apoio mútuo e ajudam-se na procura do que algum dos membros necessita. Presentemento o grupo conta com mais de 10.000 membros.

Um pouco também por acaso, vi ainda uma reportagem sobre Tamera, uma comunidade localizada há mais de 20 anos no sul de Portugal e de que nunca antes ouvira falar. Originalmente constituída por alemães, reúne agora 160 investigadores e  estudantes de diversos países com o objetivo de, entre outros, refletirem e experimentarem um modo de vida autossutentável. Em Tamera, a par de experiências de captação de água da chuva ou de energia solar, a reciclagem  é um dos objetivo a atingir. No ateliê de costura onde se reutiliza e recicla toda a roupa da comunidade, a mestre é Alice Lindstedt, uma alemã de 74 anos de idade, cujas mãos enrugadas acariciam os tecidos, sejam eles simples retalhos ou peças de vestuário. Consciente do modo como a indústria textil opera globalmente, Alice defende que os tecidos devem ser honrados, reutilizados e usados até à exaustão, em última análise como material de isolamento térmico na construção civil.

Descobri, quase ao mesmo tempo, a empresa australiana Saffars especializada há mais 40 anos em tapetes orientais. Vendem tapetes novos e usados, já que um tapete oriental nunca se desvaloriza inteiramente, e outros, belíssimos, reconstruídos, a partir de dezenas de pedaços através de técnicas de patchwork.

Kilim de patchwork.
Também Ziula Sbróglio no seu sítio Hora de mudar menciona a página de Facebook que criou, este ano, para que um grupo de pessoas da sua cidade pudesse trocar, doar, vender ou emprestar todo o tipo de artigos em segunda mão.

Todas estas propostas e apostas me fizeram refletir sobre a irracionalidade de sempre pensarmos em adquirir objetos... novos, gastando para isso imensos recursos, muito dinheiro e aumentado exponencialmente o lixo que produzimos! Com exceção de algumas peças de roupa interior e de poucos artigos de uso individual como escovas, por que razão deverei eu comprar artigos sempre novos? Sim: roupa, eletrodomésticos, mobília, casa, carro? 

Pensei depois que na verdade o meu carro, um excelente toyota yaris de 2002, foi comprado usado em 2006.

Também o meu apartamento pertence a um edifício construído em 1951 que comprei em 2006, já em 3ª. mão. Tenho também vários móveis em segunda mão: um roupeiro lindo do final do século XIX, um roupeiro pequeno dos anos 40, e, dos anos 50, uma mesa de cozinha, duas mesinhas de apoio, um sofá-cama com cama de gaveta, uma secretária de teka e um sofá individual. Dados, herdados, comprados e restaurados


Armário romântico.
Mesa de cozinha antiga

Os meus principais eletrodomésticos: fogão e exaustor, frigorífico, máquinas da roupa e da loiça e esquentador «inteligente» foram, a meu pedido, integrados no valor da compra da casa porque estavam quase novos e combinavam com a remodelação que o arquiteto a quem a comprei tinha feito a todo o apartamento, em 2002! Mas também por que pensei que não faz bem nenhum aos grandes eletrodomésticos serem levantados, inclinados e mexidos de um lado para o outro. 

Mais: eu tinha uma picadora Moulinex com quase 25 anos, a idade do meu filho! Era originalmente em tons de creme e estava já muito amarelecida, mas sempre picou tudo o que eu quis e foi só por estupidez minha que, quando tentei fazer pão ralado de pão duríssimo, se partiu uma peça no interior. Levei-a a uma dessas novas lojas de reparação de pequenos eletrodomésticos que começaram a surgir com a crise. Deixei uma caução de 10 € e a reparação ficou sujeita a orçamento. 

Mais de três meses depois (porque o negócio novo demorou bastante a organizar-se), propuseram-me um conserto de 29 € que incluía um corpo mais recente branco. Embora uma picadora nova desta marca e tipo custe entre 40€ e 50€, decidi que valia a pena. O dono da loja explicou-me que de duas picadoras velhas tinha feito uma quase nova, a minha, e ainda lhe tinham sobrado peças! Não acordámos o prazo da garantia, mas pediu-me que guardasse o número da etiqueta para o caso de alguma coisa correr mal. Agora, será que esta picadora recauchutada me irá durar mais 25 anos (e será que eu vivo mais 25 anos)? Posso estar enganada, mas acho que fiz uma boa opção!


A minha velha picadora, agora igual a esta com as letras da marca um pouco apagadas.
Assim, para mim, a grande novidade de que ainda não me tinha apercebido é que todas estas opções resultam de uma atitude de consumo consciente. Ou seja, o consumidor (eu, no caso) compromete-se se a comprar apenas o que necessita, sim, mas que já existe, ou seja, em segunda mão. Esta verdadeira «revolução» do consumo é, segundo o excelente sítio americano The Center for a New American Dream 1), exemplificada pela plataforma Etsy

Não há consumidora esperimentada que não conheça a Etsy e a lenda que a precede: oferecer milhares de itens que são verdadeiros achados! Contudo, mais do que ser apenas uma plataforma de compra e venda de artigos feitos à mão ou vintage (com mais de 20 anos), a Etsy tornou-se num modo de apoiar efetivamente as economias locais dos vários estados dos EUA, na medida em que os bens que promove não vêm nem do outro lado do mundo, nem de multinacionais, mas sim dos próprios cidadãos norteamericanos, tendo ainda em conta os respetivos estados. 

Em Portugal, não temos ainda à nossa disposição uma Etsy europeia, mas temos já algumas plataformas semelhantes activas e, com o tempo, a oferta será maior e os preços irão chegar ao seu devido valor. Antes de comprar qualquer coisa de que necessitamos, vale pois a pena consultar sítios como estes:


http://www.custojusto.pt/
http://www.olx.pt/
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1) Segundo a Wikipedia em língua inglesa,The Center for a New American Dream é uma organização não governamental cuja missão explícita é «ajudar os americanos a reduzir e a mudar o sobreconsumismo em troca de uma melhorqualidade de vida, da proteção do ambiente e da promoção da justiça social».